quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

A Incômoda Vizinha Dos Presidentes Dos EUA

Pouco depois de seu divórcio, após penosa batalha judicial nos tribunais americanos, onde amargou a perda da guarda da única filha do casal, a vida de Concepcion Picciotto ou Conchita, como é conhecida em Washington, se transformou em cacos. Nascida em Vigo na Espanha e tendo imigrado para os EUA aos 18 anos em 1963, onde logo conseguiu emprego no consulado de seu país em New York, sofreu em pouco tempo após a separação do marido ítalo-americano, sucessivos reveses que culminaram não só com a perda da guarda da filha pequena, mas também da confortável casa onde morava e até de seu bem remunerado emprego na representação diplomática espanhola.



Para muitos outros que vivenciaram situações aflitivas, emocionais e financeiras semelhantes, a solução em geral foi tentar buscar um recomeço e se reerguer na sociedade, sem esquecer os erros cometidos e as lições aprendidas na vida. Mas parece que para a então já naturalizada cidadã americana Conchita foi demais e sua estrutura psicológica ruiu, minando progressivamente sua força de vontade e coragem de lutar por uma vida digna dentro da sociedade egoísta onde vivia, levando-a gradativa e rapidamente a descer na escala social, até se tornar uma moradora de rua.

Incontáveis pessoas sem-teto em todo o mundo vivem dessa forma, relegadas a própria sorte e dependendo da caridade alheia para sobreviver. Mas Conchita possui um curioso diferencial que é o lugar onde escolheu para morar. Desde 1981, ela "reside" na Lafayette Square em frente ao nº 1600 da Avenida Pennsylvania, em Washington DC, bem diante da Casa Branca.

É lá que está montada sua barraca de nylon, seu carrinho de supermercado atulhado de roupas e utensílios, uma ou duas caixas de papelão com livros, quinquilharias e tintas com que produz seus cartazes em prol da paz e pequenos souvenirs na forma de pedras e outras miudezas pintadas geralmente com figuras com as formas de pombas, o símbolo da paz, e que as vezes são vendidas aos muitos turistas que diariamente vão até a praça para tirar fotos da sede do governo e residência do presidente americano, e que logo são atraídos pela insólita figura e cartazes que destoam da bem cuidada e elegante praça.

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Em junho de 1994 durante minha primeira visita a Washington, a movimentação de turistas em torno da colorida parafernália que serve de lar e escritório para Conception, também chamou minha atenção e terminei por me juntar aos curiosos que a cercavam e lhe dirigiam toda sorte de perguntas, sempre respondidas educadamente, em inglês ou espanhol, demonstrando que apesar do modo em que vivia, era uma pessoa culta. Na ocasião não dei maior atenção, imaginando tratar-se de mais uma mendiga temporariamente acampada no local.

Quatro anos depois voltei a capital americana, já esquecido do episódio, mas diante da sugestão de uma amiga de tirar algumas fotos da Casa Branca, voltamos a Lafayette Square e para minha surpresa lá estava ela no mesmo local. Dessa vez, bastante intrigado procurei me inteirar e fiquei sabendo de alguns detalhes da vida da pitoresca senhora, dos quais lembro dos seguintes:

Nos primeiros tempos a polícia metropolitana da capital e até mesmo agentes do serviço secreto foram implacáveis, prendendo-a e agredindo-a inúmeras vezes sob as mais diversas alegações, quase sempre a noite quando o local fica quase deserto. Daí surgiu a idéia do turbante que ela usa até hoje e que nada tem a ver com motivações religiosas ou com algum traje típico de sua terra natal, mas que na verdade serve como invólucro de camadas de tecidos, isopor e outros materiais cuidadosamente enrolados e destinados a amortececer as pancadas desferidas em sua cabeça pelos policiais com seus cassetetes.

Expulsa incontáveis vezes pelas autoridades locais, que invariavelmente davam sumiço aos seus parcos pertences, ela sempre voltava, até que grupos locais ligados a organizações de direitos humanos, invocando a Constituição através da mídia, conseguiram pelo menos teoricamente uma trégua da polícia. Mas não se engane quem pensar que isso pôs fim as hostilidades e quase sempre quando ela se dirigia a um sanitário público, ao regressar todos seus objetos haviam desaparecido. Já em 1998, ela só se afastava do local quando alguma pessoa amiga ficava de guarda protegendo seus "bens".

Essa paz aparente se baseia nas leis americanas que concedem a todo cidadão o direito de ficar por quanto tempo quiser e até dormir em qualquer lugar público...Mas desde que não se deite, pois aí estaria caracterizado o status de acampamento em locais públicos, que as mesmas leis proibem.

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Por isso, faça chuva ou faça sol, calor ou frio e até mesmo sob a neve, Conception dorme sentada dentro de sua frágil tenda de náilon, vigiada pela polícia metropolitana, sempre a espreita de que ela infrinja essa regra para poder prendê-la mais uma vez. Sobrevive com roupas e alimentos fornecidos por amigos ou com o que consegue comprar com o pouco dinheiro obtido com a venda das lembranças artesanais e manifestos políticos, gerados em sua autodenominada Vigília Permanente Anti-Nuclear E Pela Paz.

Recentemente através de amigos, Conchita colocou um site na internet http://www.prop1.org/conchita/ e apareceu em algumas cenas do filme Fahrenheit 9/11 de Michael Moore, mais provavelmente por alguns se seus posicionamentos ideológicos contrários a política externa americana.

Obs: As informações constantes do primeiro e do último parágrafo foram retiradas de http://en.wikipedia.org/wiki/Concepcion_Picciotto ; Fotos Google Images.

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